a relatividade das pequenas

terça-feira, agosto 12

Ciclismo

Cíclico. Parte de um deleite intelectual e/ou estético. Passeia pelos corredores da mente até onde a luz não vai. Fica lá na sala com obras nas paredes, dando voltas no banco para não perder a referência de espaço. Não há como ver. Volta depois de um tempo incerto e procura por você, que também deu voltas, mas agora não é mais o mesmo. É cíclico. Parte de um

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Calor mesmo. Como na América Latina. Quase nada que é dourado é ouro. Não gosto da cor, e além do mais é mais símbolo que cor. Onde trabalho há muito ouro. Ofusca as cores mais sutis. Nada lá é sutil. É uma grande afirmação. Deve-se agir com firmeza, segurança, vigilância. Quando está muito cheio é preciso ser maestro das massas. Orientar e mandar nas pessoas. Pessoas do mundo inteiro. Você usa línguas, gestos, sorrisos com olhar sério. É maluco isso: quer dizer que você tem ótimo senso de humor que tb diz “Ok, ok, vai lá, só não fode comigo”. É engraçado como podemos vestir essa carapuça de forte e determinado, elevar a voz e estar cheio da razão porque NOSSO trabalho precisa ser feito. Por que estou viajando nisso? Eu estava falando de cores.

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Estou lendo No Logo, de Naomi Klein. Não devia, Londres é muito capitalista, eu trabalho no centro, moro num bairro “pobre”. O livro é sobre corporações (é bem Fórum Social mesmo) e exploração das marcas como culto e das pessoas como galinhas. É como ler ficção científica, livros de terror, calamidade em escala global, Arca de Noé, epidemias, “Extermínio”, ódio, tristeza, manipulação, enfim, e algum senso de humor. A segunda parte é sobre culture jamming, que é uma resposta criativa e uma atitude política em relação à esse mundo do consumo e dessas grandes marcas que escondem exploração de mão de obra e o sono dos consumidores, distúrbios ecológicos e mentais e um controle remoto na inteligência humana. Não devia estar lendo porque leio no ônibus e uso como ilustração as milhares de lojas, cartazes, MacDonalds, IBMs, Starbucks, da vida e ainda trabalho no palácio de uma monarquia. Chego em casa e tenho que pular o lixo e caixinhas da KFCs e McDonalds (todos em volta de casa) que esses porcos jogam no chão. Não devia estar lendo porque trabalhei 6 meses em um Costa Coffee, que é uma rede com 500 lojas em UK e paga mal como toda rede de fast food no mundo, e explora as pessoas como ninguém e empurra para todo mundo que é legal, é cool, os clientes são legais, os funcionários são felizes (acreditem, é de chorar no fim do dia, esfregando o chão). O que você ganha por hora dá para comprar dois cafés. As pessoas fazem fila. Trabalhei tb duas horas em um lugar que parecia uma fábrica. Tínhamos que pendurar roupas em araras e nem sabiam direito para quem trabalhavam. Era terceirizado. Só negros e indianos. A autora fala de fábricas em Singapura, China, Brasil (General Motors) onde grandes empresas tem isenção fiscal, e as cidades que as recebem são escravas dessa idéia de gerar emprego, mas não tem dinheiro para melhorar o transporte, a moradia. Emprego, o grande desespero! Pega-se a primeira coisa que aparece. Daí você olha Coca-cola e pensa, bem, é uma marca de sucesso, todo mundo gosta, é isso aí. O que a marca faz é desvincular-se da produção. Então se houver exploração do trabalho humano, não é culpa do Nike no pé ou do anúncio da Gap na Dazed and Confuzed, mas de algum indiano que contrata indianos na índia para trabalhar para a Microsoft.
Pelo menos foi isso que entendi.
Eu escolhi vir para o primeiro mundo e ser classe baixa. A maioria da humanidade não tem escolha, claro. Mas tudo o que existe é responsabilidade nossa. Ninguém é essencialmente vítima.
Toneladas de sanduíches são jogados fora de lojas como Costa porque vencerão no dia seguinte. Os funcionários, quando podem, levam para casa. Quando não, pegam do lixo. Eu fiz isso. Sem maiores dramas, diga-se de passagem.
Estávamos em Paris e ligamos a TV no quarto. Começou a tocar O Guarani e então lá estava o curta Ilha das Flores (o título em francês fica mais irônico ainda). O curta mais óbvio e envolvente possível. Lembro de ter visto a primeira vez no colégio. Era um programa de TV sobre globalização.
Ganho um pouco mais hoje, mas mais do que nunca a idéia de “marca”, de corporação está presente. A monarquia é poder idealizado ao extremo. È idéia pura, abstração. E por trás da abstração milhões em obras de arte e ouro, palácios, lojas para turistas.
Em Londres coexistem todos esses mundos. É o lugar da moda, do dinheiro, das redes, da monarquia, da arte, dos imigrantes, da exploração, do lixo e do ouro. O mundo vê essas cidades como uma grande marca e onde tudo acontece. Lá estão as verdadeiras coisas, o que o mundo globalizado almeja e consome pelas bordas. Lá você pode experimentar um pouco do mundo livre e ideal, limpo, cool, bonito, com a droga certa, a música mais maluca, a biblioteca mais completa, as ruas mais cosmopolitas (que ironia isso) com coisas admiráveis acontecendo a cada instante.
Então as pessoas chegam em navios e a maioria é “desqualificada” e vai parar primeiro num sub emprego (com uma fachada super cool) depois no home office, que é quem dá os vistos. Eu fui num dos seus escritórios com uma amiga. É um ginásio com milhares de pessoas do mundo inteiro com senhas na mão e uma angústia para ouvir um veredicto, um carimbo, um papel que diz: ok, você pode começar a sonhar legalmente, por seis meses.
Tudo isso é tão óbvio. O mundo imaginário, como passar pela infância e chegar na adolescência. Então o mundo. Porém, nesse mundo talvez eu exista mais. Porque não faz sentido, ou porque os sentidos foram desafiados.






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